biquíni

Biquíni e Linguagem

Você pode estar se perguntando o que exatamente biquíni pode ter a ver com linguagem. Tem muito mais do que você pode imaginar. Neste artigo, pretendo tratar do uso de certas normas e como elas podem ser utilizadas de maneira errada, ou melhor, inapropriada a depender do contexto e do ambiente.

O que é um biquíni?

Trata-se de um traje de banho feminino composto por duas peças, muito parecido com a lingerie utilizada no dia a dia, porém é utilizado especificamente para banho em piscina ou na praia. A diferença entre o biquíni e o maiô está no formato e na quantidade de peças do traje. O maiô é uma peça única cobrindo seios, barriga e quadris.

No dia 05 de junho de 1946, em Paris, um badalado evento apresentou ao mundo o Bikini:

“Atome, le plus petit maillot de bain du monde.”
“Átomo, o menor traje de banho do mundo.”

“Le Bikini, le maillot de bain plus petit que le plus petit maillot de bain du monde.”
“O Bikini, o traje de banho menor que o menor traje de banho do mundo.”

“Le Bikini, la première bombe an-atomique!”
“O Bikini, a primeira bomba an-atômica!”

Meu francês não é tão bom assim (traduzi maillot por traje propositalmente), mas deu pra perceber que Bikini fazia referência direta ao Atol de Bikini. Esse local serviu de testes norte-americanos com bombas nucleares. Isso fica claro no terceiro slogan quando fazem um trocadilho com anatômico (referente ao corpo) e an-atômico (“não atômico”, referente ao átomo).

Essa relação com a bomba atômica estava tão forte que Diana Vreeland, jornalista e crítica de moda, disse: “o Bikini é a coisa mais importante depois da invenção da bomba atômica”.

Depois daquele horror que ocorreu em Hiroshima e Nagasaki, cidades do Japão bombardeadas pelos Estados Unidos na II Guerra Mundial, o impacto causado pelas explosões serviu bem aos propósitos do marketing na venda do traje inovador.

NOTA DE DEVANEIO:

Pode ser que a “Fenda do Bikini”, do desenho Bob Esponja, seja alguma referência aos testes nucleares ocorridos no atol de Bikini, daí a “fenda” e tantas mutações que aparecem no desenho… não sei até que ponto isso é verídico, mas parece…

O que o biquíni tem a ver com a Linguagem?

Percebam que uma mulher com esse traje está efetivamente usando calcinha e sutiã em público. Não sou puritano, mas essa mesma mulher, em uma loja de roupas, vai tentar se cobrir se a cortina cair .

Não é hipocrisia. Utilizar biquíni na piscina e na praia é socialmente aceitável, mas utilizar langerie em público não é socialmente aceitável. Assim, não há incoerência nas cenas apresentadas. O mesmo ocorre com a linguagem, pois uma determinada modalidade pode ser utilizada por um mesmo falante. Esse indivíduo pode passear entre mais de uma comunidade de fala, recorrer a modalidades mais ou menos formais.

Professores de Física não ficam conversando sobre Movimento Uniformemente Variado numa mesa de bar. Professores de Português não utilizam a norma-padrão num churrasco de domingo com a família (não os normais). Tome cuidado ao utilizar uma norma em uma comunidade diferente daquela que a considera “boa”.

Muito se espera da fala de professores, não só os de português. Muitos professores recebem e-mail cheios de formalismos desnecessários. Claro que você não vai enviar um ofício para o reitor da sua universidade chamando-o de “você”, mas não precisa caçoar do amigo que não sabe todas as regras de colocação pronominal.

Mas o que significa Biquíni?

Como já disse, o nome é proveniente do Atol de Bikini (pronunciado /ˈbɪkɪˌniː/ ou /bɪˈkiːni/), que vem da língua marshalesa (também conhecida como Ebon, uma língua malaio-polinésia falada nas Ilhas Marshall). A pronúncia local é mais próxima de “Pikinni”, [pʲi͡ɯɡɯ͡inʲːii̯], algo como “lugar de cocos”.

Imagina um homem usando um… não precisa imaginar, já existe… Caso tenha visto o filme “Borat”, você viu o personagem vestindo um “mankini” (cuidado quando for procurar no Google).

E se geralmente o prefixo “bi-” significa “dois”, então “bikini” seria “dois kini”(?)… Assim, podemos ter um “monokini“! Sim, isso existe… na prática é uma mistura de maiô com biquíni. Existe desde 1964 e também era chamado de “unikini”, provável associação com a palavra “unique” (único).

Mais interessante é ver como os processos composicionais atuaram nessa palavra que é formada originalmente de “Pik” (superfície) e “ni” (coco). Repare que “kini” não deveria ser nada, mas passou a carregar todo o significado de “traje de banho feminino em duas partes”. Penso que pouquíssimas pessoas têm, atualmente, acesso ao frame da bomba ao ver um biquíni. Essa seria uma metáfora opaca.

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